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Visão 2020 – O projecto de Investir no Turismo em Marrocos

O sector do turismo em Marrocos tem vindo a desenvolver-se nas últimas décadas, baseando-se fortemente no discurso da identidade cultural e de uma desejada marroquinidade, ao mesmo tempo que o desenvolvimento económico do país se revela uma prioridade nas políticas nacionais, bem como nas relações internacionais.

Visão 2020 – desenvolvimento sustentável

Recentemente, o Ministro do pelouro do Turismo e do Artesanato veio apresentar um novo plano estratégico para o sector, a Visão 2020, que tem como objectivos principais a regionalização do turismo, o incentivo à qualidade e o incentivo à qualidade. Este plano contou com o impulso do próprio soberano do país, o Rei Mohammed VI, como factor de valorização das várias regiões de Marrocos, bem como do turismo responsável nas práticas ambientais e ecológicas.

Numa altura em que o país traça novos objectivos, perante importantes reformas políticas, a questão do paradigma tradição versus modernidade revela-se bastante pertinente para que possa integrar de forma responsável e harmoniosa a sua própria identidade cultural numa perspectiva de desenvolvimento económico e social.

Visão 2020 – regionalização, qualidade, sustentabilidade

O século XX, ao mesmo tempo que constituiu uma viragem na evolução das cidades de Marrocos e do seu espaço urbano moderno, constituiu igualmente uma viragem determinante na evolução dos tecidos urbanos históricos do país. (Chouiki, 2009) A ruptura estabelecida durante o período colonial não permitiu à sociedade marroquina desenhar a sua própria modernidade, com base numa evolução natural da sua cultura urbana e numa lógica patrimonial estabelecida com os seus próprios referentes.

As dinâmicas sociais e culturais que animavam a cidadania na medina extinguiram-se em favor das lógicas comerciais e turísticas. Esta subversão da relação das comunidades com estes espaços remeteu a cultura do património para uma discussão de elites. Um plano de acção que ajude a promover uma reconciliação da população com o seu património é necessário para emergência de uma cultura do património participativa, de valorização social das comunidades locais.

No Norte de África em geral e particularmente no Magreb, a diversidade cultural, que se manifesta pelo uso quotidiano de vários idiomas berberofones e arabofones, foi reduzida após as independências por políticas culturais nacionais de uniformização. Após o início dos anos de 1990, os estados magrebinos tomaram então consciência da importância da diversidade cultural, mas este reconhecimento passou também novamente por uma estratégia de desenvolvimento económico, nomeadamente ao nível do turismo cultural no que diz respeito a Marrocos. (Kessab, 2009)

O recente plano de regionalização em Marrocos, bem como a instituição do amazigh como língua oficial, a par com o árabe, e o seu ensino oficial no ensino básico revelam que esta postura de reconhecimento e reconciliação com a multiculturalidade em Marrocos tem tido efeitos práticos nas políticas nacionais. O carácter multicultural do território extrapola-se precisamente nas dinâmicas de patrimonialização e no reconhecimento dos ícones patrimoniais e turísticos que representam a sua identidade cultural.

Se analisarmos a lista de objectos inscritos como património mundial da UNESCO damos conta claramente desta tendência:

  • A medina de Fez, inscrita em 1981
  • A medina de Marrakech, inscrita em 1985
  • O Ksar de Aït-Ben-Haddou, inscrito em 1987
  • A cidade histórica de Meknes, inscrita em 1996
  • O sítio arqueológico de Volubilis, inscrito em 1997
  • A medina de Tetouan, inscrita em 1997
  • A medina de Essaouira (antiga Mogador), inscrita em 2001
  • O espaço cultural da Praça de Jemaa el Fna, inscrito em 2001
  • A cidade portuguesa de Mazagão (El Jadida) inscrita em 2004
  • O moussem de Tan Tan, inscrito em 2005

A lista do património mundial em Marrocos engloba objectos bastante distintos e que representam então o discurso contemporâneo de uma sociedade plural. Esses objectos incluem numa mesma lista as cidades imperiais, a cultura berbere, a antiguidade clássica do mediterrâneo, bem com o património de origem portuguesa como é a “cidade portuguesa” de Mazagão e ainda a cultura nómada do Saara.

Turismo responsável no futuro do turismo em Marrocos

Marrocos, no momento contemporâneo, pretende aparentemente seguir a sua própria modernidade, baseado na ideia de um país de influências tão diversas e com comunidades e expressões culturais que contribuem para formação de uma identidade plural. O desafio do país está então na gestão de um património cultural tão vasto e na sua dinamização e integração para o desenvolvimento nacional.

No passado dia 30 de Novembro, foi apresentado em Marrakech o novo plano estratégico para o desenvolvimento do turismo, na presença do Rei Mohammed VI, e que visa redobrar a actividade turística, colocando Marrocos entre os 20 primeiros destinos do turismo mundial. Com este objecto, oitos novos destinos turísticos serão também criados nos próximos anos, bem como 200.000 novas camas no sector da hotelaria. O objectivo passa pela duplicação de entradas do número de turistas estrangeiros e a triplicação do número de turistas nacionais.

No entanto, para além do forte crescimento económico pretendido, o plano integra uma concepção muito mais transversal dos impactos do turismo no país. O desenvolvimento do turismo em Marrocos considera também a importância da preservação dos recursos naturais, a manutenção da autenticidade sócio-cultural das regiões e ainda o desenvolvimento do bem estar das populações locais como estratégias integradas. Deste modo, surgirão os “eco-territórios”, tal como são designados pelo ministério do turismo, como vitrinas de Marrocos e do desenvolvimento sustentável.

Logo do Turismo de Marrocos

O plano desenha uma nova imagem para Marrocos, em que o património cultural reclama um lugar na modernidade, através da aplicação de tendências tão contemporâneas como a valorização da qualidade e da sustentabilidade ambiental e ecológica, não perdendo de vista as especificidades locais de cada região.

Através da aplicação destes novos vectores, Marrocos pretende posicionar-se num lugar de destaque perante a comunidade internacional, oferecendo um produto singular neste sector.

Há muitos festivais em Marrocos. A actividade cultural e a oferta de actividades de lazer pretendem garantir também um carácter internacional, que de resto, tem vindo a verificar-se já nos últimos anos com programação cultural de grande qualidade como é o Festival de Cinema de Marrakech ou o Festival do Riso em Marrakech, o Festival de Músicas Sagradas de Fez, o Festival de Música Gnawa de Essaouira, o Festival de Jazz de Tânger ou o Festival Mawazine de Rabat.

Seis grandes projectos estruturais, implementados e financiados pelo Estado, as regiões e o sector privado serão postos em prática:

  • o programa Azur 2020 (que é a continuação do Plano Azur que integrava o projecto estratégico Visão 2010 e que implementou seis resorts balneares novos);
  • o programa Patrimoine et Héritage (para a divulgação da identidade cultural de Marrocos);
  • o programa Eco & Green (para a valorização dos espaços naturais preservados de excepção);
  • o programa Animation et Loisirs (para a dinamização e competitividade da oferta turística e hoteleira);
  • o programa Niches à forte Valeur Ajoutée (que colocará Marrocos nos destinos internacionais para o Bem Estar);
  • o programa Biladi (uma das principais prioridades da Visão 2020 que prevê a criação de sete estâncias turísticas dedicadas ao turismo nacional, nas áreas mais procuradas pelos cidadãos marroquinos).

A coordenação do plano estratégico será assegurada pela Alta Autoridade para o Turismo para a aplicação do plano no território nacional e para a assegurar a coerência das estratégias regionais. Em paralelo está ainda prevista a criação de Agências para o Desenvolvimento Turístico para a materialização e aplicação dos procedimentos de gestão integrada dos territórios.

A aplicabilidade deste programa estratégico Visão 2020 dependerá então de um fundo de investimento o Fundo Marroquino para o Desenvolvimento Turístico financiado quer pelo Estado, quer pela cooperação de países amigos.

A dicotomia tradição / modernidade estabelecida no período colonial assombrou a evolução urbana das cidades marroquinas e as políticas patrimoniais desenvolvidas para a salvaguarda dos bens culturais. Reproduzir a oposição entre património e modernidade é reproduzir de novo a ideologia colonial. (Chouiki, 2009: 4)

O desenvolvimento de programas de fomento do turismo, tal como é a Visão 2020, deverá reflectir portanto a capacidade de Marrocos em afirmar a sua identidade cultural, os seus regionalismos e a sua pluralidade, a salvaguarda dos seus patrimónios e a coordenação da política sócio-cultural com o desenvolvimento económico e a modernização sustentável, ambiental, através de uma aposta na qualidade.

Bibliografia

Chouiki, Mustapha (2009), Faut-il repenser notre culture du patrimoine?

Governo do Reino de Marrocos (2011), Tourisme: Vison 2020 in link

Kessab, Ammar (2009), Les politiques culturelles en Afrique du Nord – Maghreb – Sont-elles compatibles avec la convention de l’UNESCO sur la protection et la promotion de la diversité des expressions culturelles? Johannesburg: World Arts Summit on Arts and Culture.

Texto da autoria de: Ana Neno, arquitecta e estudante de doutoramento dos programas Patrimónios de Influência Portuguesa (Universidade de Coimbra) e Turismo, Património e Gestão Territorial (Universidade Cadi Ayyad de Marrakech).

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